Saída à francesa: resultado das eleições expõe apreensão do varejo brasileiro

Eleições
Coalização de centro-esquerda mantém vivo, por hora, acordo do livre comércio entre Mercosul e a União Europeia, e nutre esperança do comércio internacional do Brasil

A reviravolta nas eleições francesas de 2024 geraram uma surpresa no cenário global, seja pelo lado político ou econômico, o resultado trouxe à tona a divisão que vivem os franceses, mesmo diante de uma coalizão unindo diferentes campos políticos. A Nova Frente Popular (esquerda) ficou com mais assentos na Assembleia Nacional (182), enquanto o Juntos (centro) ficou com 168 e o Reunião Nacional (extrema direita) com 143.

O cenário é conflitante, Emmanuel Macron ainda é o presidente, mas precisará alinhar as expectativas com a esquerda para conseguir governar. A luta não foi vencida nem pelos governistas e nem pelos conservadores. O resultado joga uma nuvem de incertezas que respinga em diversos mercados, dentre eles o brasileiro, que aguarda há 15 anos pelo desfecho do acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia, estagnado por Macron após os intensos protestos de produtores agrícolas da França, uma das principais bases de apoio do mandatário francês.

“A vitória da esquerda nas eleições francesas pode causar instabilidade econômica na Europa, impactando nas exportações brasileiras devido a uma possível redução na demanda europeia​. Além disso, novas eleições na Europa podem alterar políticas agrícolas, afetando os preços dos alimentos no mercado internacional”, afirmou Charluan Gamballe, investidor especializado em Agronegócio e CEO da GCS Capital.

As negociações entre Macron (centro) e a esquerda terão início no decorrer da semana e, pelo que descreve a imprensa francesa, será um cenário “tenso e desafiador” para o atual governo. Não será a primeira vez que os dois chefes (de Estado e Governo) franceses, completamente opostos no campo ideológico, precisarão dividir o poder para frear a ascensão da extrema direita, que acumulou um crescimento exponencial nos últimos dez anos com discursos anti-imigração e de proteção econômica.

Nesta segunda-feira (8), Gabriel Attal, aliado de Macron e atual primeiro-ministro, teve sua renúncia rejeitada pelo presidente sob o argumento de que é necessária a sua presença “por enquanto” e durante as negociações com os esquerdistas na busca de um denominador comum. Veículos de comunicação como a AFP e a France24, afirmam que é questão de tempo para Attal deixar o cargo efetivamente.

“Apesar da França ser uma das maiores economias europeias, essa eleição não deverá fazer grandes mudanças no cenário das trocas internacionais na zona do Euro no curto prazo. Vale lembrar que, alimentos exportados pelo Brasil à Europa mantêm uma regularidade independentemente dos governos que estejam no poder em ambas às partes“, explicou Guilherme Carvalhido, cientista social da Universidade Veiga de Almeida.

Mera especulação

O Governo brasileiro, por meio de uma publicação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), parabenizou os vencedores da eleição francesa 2024, “Muito feliz com a demonstração de grandeza e maturidade das forças políticas da França que se uniram contra o extremismo nas eleições legislativas de hoje“, escreveu em sua conta no X/twitter.

Apesar da ‘celebração’ entoada pelo Governo, o mercado brasileiro observa os possíveis desdobramentos de uma mudança na postura comercial da França com países emergentes, “é importante considerar o impacto das políticas monetárias e fiscais adotadas após as eleições. Por exemplo, uma política expansionista na França pode desvalorizar o euro, afetando a competitividade entre os países”, afirmou Gamballe.

Segundo números do Banco Central, a França é o terceiro maior investidor no Brasil, com mais de US$ 38 bilhões aplicados. São cerca de 860 empresas atuando no país, entre elas duas gigantes do varejo supermercadista: Carrefour e Pão de Açúcar, de origem brasileira mas de propriedade da Casino. A importância se reflete nos números como US$ 8,4 bilhões em transações comerciais em 2023.

O resultado das eleições pode ser positivo para o varejo brasileiro, que aguarda definições sobre a importação de alimentos pelos franceses. Isso significa que, quando um determinado produto exportado tem queda nos níveis de venda, ele fica mais acessível para o mercado brasileiro. Nos últimos meses, itens como carne bovina e soja ficaram mais baratos para o consumidor devido a queda nas exportações.

Entretanto, a visão comercial do resultado na França é mais especulação do que fato consumado para o varejo brasileiro, “O Brasil tem muito mais influência de importação de alimentos da Itália e outros países europeus do que a França. Portanto, mesmo que haja alguma movimentação na economia por lá, pouco irá influenciar no mercado de importados brasileiros”, explicou Egberto Chokyuy, diretor comercial do Royal Supermercados.

Por Publicado em: 8 de julho de 20240 Comentários