Reforma Tributária: supermercados querem taxação das bets para aumentarem a cesta básica nacional

Supermercados se movimentam na busca de tributação zero na cesta básica nacional e o aumento de itens sem nova alíquota

A resposta dos supermercados às novas regras de tributação dos alimentos da nova cesta básica foi entregue em uma proposta que envolve diretamente outro setor observado pela secretária extraordinária da Reforma Tributária: as casas de apostas online chamadas, no Brasil, de bets.

Segundo a Associação Brasileira de Supermercados (Abras), a taxação das bets com o IS, imposto seletivo, usado para desestimular o consumo de produtos nocivos à saúde e ao meio ambiente, na regulamentação da reforma tributária pode dar lugar ao aumento de itens da cesta básica nacional, como?

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Para desonerar um produto, o governo precisa redirecionar o tributo para outro(s) produto(s) visando compensar esse ‘benefício’ concedido. Com os produtos da cesta básica isentos de tributos, esse valor será realocado em outros itens do supermercado.

Entretanto, a Abras defende que o mercado de apostas online deve sofrer a mesma incidência do IS que outros produtos vendidos em supermercados, justificando que as apostas podem gerar vícios tornando-se, portanto, uma questão de saúde pública.

Nesse cenário proposto, os supermercados evitariam o aumento exagerado de preço em outros itens e a ‘compensação’ seria, em parte, paga pelas bets, “Estamos falando de receitas absurdas arrecadadas pelos jogos. É uma questão de saúde pública e deveria constar como imposto seletivo”, afirmou João Galassi, presidente da Abras.

Outro desagrado crescente dos supermercados, segundo a Abras, é a ‘fuga’ da cesta básica nacional ao texto constitucional. A portaria do Ministério de Desenvolvimento e Assistência Social definiu dez grupos alimentares antes da entrega do texto: feijões (leguminosas); cereais; raízes e tubérculos; legumes e verduras; frutas; castanhas e nozes (oleaginosas); carnes e ovos; leites e queijos; açúcares, sal, óleos e gorduras; e o grupo de café, chá, mate e especiarias.

Segundo a Abras, a cesta básica nacional apresentada traz o que ele classifica como “viés discriminatório”, porque distancia ainda mais a população mais pobre do consumo ideal, principalmente, em alimentos de proteína animal. “Quando ele (Rodrigo Orair, diretor de programa da secretaria Extraordinária de Reforma Tributária) diz que a carne é consumida tanto pela população mais rica como mais pobre na mesma proporção, um por um, deveria considerar que ela é um produto extremamente importante para ser alijada da cesta básica nacional”, argumenta Galassi sobre a não inclusão desses produtos na cesta isenta.

Padrão de consumo interessa aos supermercados

A proposta apresentada pela Abras caminha para aliviar a carga tributária que vem se desenhando para o setor supermercadista. Em uma rápida explicação, quanto maior a cesta básica for, mais renda poderá ser convertida no varejo. “Para os supermercados significa aumento das vendas, uma vez que a economia com os itens da cesta básica garantirá renda disponível para aquisição de outros produtos”, explicou William Figueiredo, consultor econômico da ASSERJ e economista na Future Tank.

O setor aguarda ansiosamente a definição da cesta básica nacional que ainda precisará passar pelo Congresso Nacional, onde pode sofrer alterações. Segundo o advogado especialista em direito tributário Fabrício Tonegutti, as mudanças na tributação dos alimentos servirá para ‘embaralhar novamente as cartas do jogo’, colocando uma incógnita sobre o novo padrão de consumo da classe média brasileira.

“De maneira direta, os supermercados vão experimentar uma migração no padrão de consumo dos consumidores. O que é caro poderá ficar mais caro, e o que é barato ficar ainda mais barato”, afirmou o especialista.

Entretanto, Tonegutti destaca que ‘historicamente’ o varejo não desloca tão facilmente o preço uma vez que consegue encontrar o valor ideal do produto. “O setor poderá se preparar mirando no perfil de consumo. As mudanças serão muito agressivas. Ela certamente acontecerá para os produtos que não estarão na cesta básica”, afirmou o advogado.

Com esse cenário, os tributos serão novamente distribuídos entre a indústria e o varejo onde, atualmente, a taxação, em grande parte, está na produção e não nas vendas.

Essa agressividade no preço, no entanto, vai trazer transparência ao consumidor, permitindo que o mesmo identifique o valor real do produto e o valor do tributo.

“Uma das maiores alíquotas do mundo”

O ponto de junção entre o agronegócio, outro setor interessado na cesta básica, e os supermercados, é justamente o tamanho da cesta básica, ambos querem que ela aumente. Os 18 itens presentes na proposta de regulamentação gera expectativa sobre o que será feito com a defasagem de tributos dos alimentos que serão beneficiados.

O economista e coordenador do curso de Ciências Econômicas do Senac EAD de São Paulo, Marcelo Cerqueira, avalia que o imposto cobrado sobre outros produtos de fora da cesta básica, estimada em 27,5%, ligou o sinal de alerta para os setores.

“Será uma das maiores alíquotas do mundo. A chamada alíquota geral do futuro IVA, antigo imposto sobre o consumo, pode ser pressionada para cima, caso a cesta básica sofra alterações consideráveis”, explicou Cerqueira.

O professor se refere à possível inclusão de novos produtos que fogem do conceito de ‘cesta básica’ como fois gras e caviar, algo que gerou um forte embate entre o governo e os supermercadistas. “A tendência é que os supermercados procurem recompor sua margem de lucro acrescendo no preço de produtos que não fazem parte da cesta básica”, ressaltou o professor, defendendo que esse movimento será algo natural e esperado.

Por Publicado em: 30 de abril de 20240 Comentários