Supermercados e indústria do Rio negociam descontos em nome de vendas

RIO – A perda de 1% nas vendas em 2017 no Rio de Janeiro — metade do prejuízo esperado em meio à crise fiscal que derrubou o consumo no estado — foi motivo de comemoração para os supermercados fluminenses. Esse resultado foi obtido graças à união entre varejo e indústria. Para garantir vendas, os dois setores negociaram promoções, sobretudo reduções de preço, e precisaram abrir mão de parte de suas margens de ganho. Foi um caminho para estimular o consumo e, por consequência, também a produção. Com o fim da recessão, o setor supermercadista já mostra recuperação no país. No Rio, porém, as melhores apostas são de fechar 2018 com estabilidade. Para que isso aconteça, avaliam as empresas, o casamento indústria-varejo precisa continuar.

— Na crise, é como se tivesse havido um velório e todos tivessem chorado o morto juntos. É o momento em que todos se unem, se ajudam. Mas o enterro acabou, ao menos para o resto do Brasil. No Rio, ainda não. Nos anos de recessão, houve muita promoção para garantir vendas e fomentar a atividade industrial. Então, o varejo e a indústria se uniram. No mercado fluminense, esse movimento precisa continuar este ano — avalia Fábio Queiroz, presidente da Associação de Supermercados do Estado do Rio de Janeiro (Asserj).

No Brasil, as vendas do setor supermercadista avançaram 4,3% em 2017, para R$ 353,2 bilhões, segundo pesquisa da Associação Brasileira de Supermercados (Abras) em parceria com a consultoria Nielsen, após ter ficado estável em 2016. No Rio, o faturamento bateu R$ 38,8 bilhões, queda de 1% em relação a 2016. A estabilidade só deve vir este ano.

— No ano passado, a redução de preços se intensificou no varejo. E isso impacta as vendas. Houve aumento de vendas em consequência de promoções em todos os mercados que acompanhamos. No Rio, com uma deflação dos alimentos superior à registrada no resto do país, as promoções devem ter tido um peso ainda maior — explica Ana Szasz, consultora de varejo da Nielsen.

‘AINDA NÃO SAÍMOS DA CRISE’

O consumidor, no entanto, continua Ana, tem uma baixa percepção dessa redução de preços nas prateleiras. Em 2017, apenas 6% das vendas com descontos fizeram o consumidor levar para casa algo que não planejava adquirir. Mas cresceu o número de categorias em que o desconto ganhou relevância para alavancar as vendas. Em 72,1% das categorias que reduziram preços houve aumento de vendas. E 33,6% daquelas que fizeram promoção teriam registrado queda nas vendas sem a remarcação.

— Isso mostra que o varejo e a indústria devem estar atentos. Será que se faz tanto corte de preço que o desconto já não dá o gostinho de promoção verdadeira? É preciso dar desconto de forma pensada. A duração da promoção tem que ser pontual, avaliar frequência e a profundidade, além de casar com outras ações — destaca Ana.

Do lado da indústria, a visão não é diferente.

— A crise fez o varejo e a indústria trabalharem a quatro mãos. Não é só baixar preço, mas ter estratégia de venda, de exposição de produto. São ajustes que podem fazer as vendas saltarem. E a indústria pode ajudar muito nesse sentido. Existe demanda pela redução de preço, mas tudo depende do perfil da loja — explica Tarcísio Bravo Júnior, diretor comercial da Limppano, de produtos de limpeza.

Queiroz, da Asserj, destaca que o perfil do varejo fluminense ajuda na negociação com a indústria:

— O Rio é marcado pela atuação de grandes redes regionais, que têm grande força de negociação e composição de preço. As redes menores já entenderam que a escala ajuda na parceria com a indústria. O surgimento da Integra é exemplo disso.

As redes SuperPrix, Princesa, Costazul, Vianense, Bramil, Campeão, Real de Itaipu e Inter criaram a Central de Negócios Integra, reunindo 130 lojas. É aposta em ganho de escala, explica Viviane Areal, diretora do SuperPrix:

Os grandes do setor confirmam os esforços em corte de preço. Sérgio Leite, diretor comercial do Mundial, que tem 18 unidades e abrirá mais duas este ano, na Barra da Tijuca e em Niterói, avalia que a parceria com a indústria precisa permanecer:

— Tem que continuar. Ao contrário do resto do Brasil, ainda não saímos da crise. O governo fluminense ainda não botou os salários em dia. O Rio precisa ser ainda encarado como praça deficitária.

Apesar da crise, o Mundial registrou alta de 1,5% nas vendas em 2017. Descontando-se a inflação, porém, houve queda. Leite estima que este ano deve haver crescimento real:

— Confiamos na melhora e estamos investindo em expansão. Mas, por ora, é preciso manter promoções. Estamos revendo margens para manter o cliente ativo em algumas categorias, sobretudo em limpeza da casa e higiene pessoal. Produtos como amaciante e sabonete líquido já eram hábito e foram sendo cortados.

Para Ana, da Nielsen, o desconto pode, de fato, manter alguns itens no carrinho, mas o varejo deve apostar em um conjunto de ações:

— As promoções podem evitar que o consumidor desista de comprar produtos de uma categoria específica. Está claro, porém, para o varejo e para a indústria, que esse movimento não depende apenas do preço. É preciso entender a necessidade do cliente, rever embalagens e formatos de apresentação de um produto, avaliar a exposição na loja.

Com 25 lojas e previsão de abrir mais uma este ano, a rede Supermercados Guanabara mantém a estratégia de preços baixos.

— O Guanabara tem longa parceria com os fornecedores. Cada dia da semana temos uma seção a preço de custo. Também trabalhamos com produtos-chave em promoção. O grande momento é o Aniversário do Guanabara, quando a rede trabalha com preços ainda mais baixos — conta Lenício Barbosa, diretor de operação do grupo. — Apenas o preço competitivo deixou de ser um diferencial.

Mas ele admite que é preciso trabalhar com redução na margem de lucro:

— Já enfrentamos crises piores do que essa, inclusive com inflação e taxas de desemprego maiores do que temos hoje. Então, a estratégia é manter crescimento com margem menor de lucro.

PREOCUPAÇÃO COM A MARGEM DE GANHO

O impacto nos ganhos preocupa o varejo. André Portes, à frente do Multimarket, diz que o foco, agora, deve ser retomar a margem saudável de vendas:

Rodrigo Gagliardi, gerente executivo de vendas da JBS Carnes, faz coro:

— Cortar preço reduz margem. Se o varejista não tiver boa estratégia, corrói seus ganhos.

Fonte: O GLOBO

Por Publicado em: 3 de abril de 20180 Comentários