Eventos climáticos e dólar alto elevam projeções para o preço dos alimentos

Inflação

Uma combinação de eventos climáticos — com um El Niño mais forte, somado aos efeitos da tragédia das chuvas no Rio Grande do Sul e a uma antecipação do La Niña— e a escalada do dólar levaram bancos, consultorias e corretoras a revisarem suas projeções para este ano. Instituições que antes previam alta de 3,5% para estes itens esperam aumento de 4,5% a 7,5% no ano nos alimentos que fazem parte da cesta de compras das famílias.

Trata-se de aumento superior ao da inflação geral, que deve encerrar o ano em torno de 3,96%, segundo o Boletim Focus. Com isso, arroz, legumes, verduras e frutas não devem ceder significativamente no segundo semestre. E até carnes e leite, que ficaram mais baratos nos últimos 12 meses, podem voltar a subir. Para economistas, a perspectiva de preços de alimentos mais altos é um risco adicional no radar do Banco Central. A autoridade monetária, que calibra os juros na tentativa de controlar a inflação, já interrompeu o ciclo de queda da Selic, na quinta-feira, diante da escalada da moeda americana e riscos fiscais crescentes.

—O BC não reage aos choques primários, mas se ele estiver vendo que o preço de alimentação pode contaminar outros preços, aí entra a política monetária. Por isso, a alimentação é um risco adicional nesse cenário, já que a inflação geral pode ser maior e isso pode contaminar expectativas da inflação em 2025 — resume Alessandra Ribeiro, economista da Tendências.

Em comunicado, a autoridade monetária explica que a manutenção da Selic em 10,5%ao ano se deve ao cenário global incerto e ao cenário doméstico, marcado pela atividade aquecida e pelo aumento das projeções de inflação.

Alessandra, da Tendências, avalia que a política fiscal expansionista vem afetando o dólar, o que se reflete com certa defasagem nos preços ao consumidor e exige cautela: “O BC está olhando esse cenário de riscos e preocupado com a inflação futura”, afirma.

A Tendências revisou de 3,5%para 4,5% a projeção para alimentação no domicílio em2024, puxado pelos efeitos do El Niño e pela tragédia no Rio Grande do Sul. Segundo Alessandra, o El Niño afetou a oferta de alimentos in natura como cebola e batata. Em razão das enchentes do Rio Grande do Sul, ela espera ainda altas de preços mais persistentes de arroz, trigo e soja, o que poderá impactar indiretamente outras cadeias, como a de pães e carnes.

Coordenador dos Índices de Preços do Ibre/FGV, André Braz lembra que os preços dos alimentos consumidos em casa costumam apresentar certa trégua entre maio e julho, mas não é o que tem ocorrido. O ciclo agrícola foi bastante afetado pelo El Niño no primeiro semestre, destaca o economista, e a seca no Centro Oeste, entre abril e maio, afetou a produção de soja e milho e pode deixar frango e ovos mais caros. No caso de itens ligados a hortifruti, os impactos da tragédia no Rio Grande do Sul já apareceram no IPCA de maio, com alta de 0,62% do grupo Alimentação e bebidas.

Com isso, os alimentos in natura que registrariam queda nos preços nesta época do ano, ficaram mais caros. Por consequência, a alimentação no domicílio em 12 meses, que afeta mais as famílias de menor renda, está subindo e já influencia nas expectativas de inflação para este ano e 2025, diz Braz: “Isso cria uma rigidez maior na taxa de juros. Como cortar juros se a inflação deve aumentar? Isso vai forçar com que mantenhamos uma política monetária mais contracionista e isso não é bom. O juro alto pode tirar a boa fase do mercado de trabalho e diminuir o poder aquisitivo das famílias”.

Fonte: O Globo

Por Publicado em: 21 de junho de 20240 Comentários