Coluna: Mas doutor, essa multa é confiscatória!
Temos verificado que a menção à “multa confiscatória” e, muitas das vezes, “multa arbitrária” – expressão relacionada às áreas tributária e fiscal –, tem sido uma constante nas indicações dos profissionais e empresários do ramo varejista, principalmente após o cenário de recessão econômica que assolou o nosso país.
Adentrando na seara mais complexa da questão, destacamos as multas tributárias como penalidades administrativas aplicadas em razão de determinada infração a uma obrigação fiscal, as quais podem ser punitivas ou desestimuladoras, dependendo do tipo de violação cometida pelo contribuinte. Ou seja, trata-se de coerção objetiva que o Estado – por meio da edição de suas leis, as quais estipulam o regramento tributário à aplicabilidade das multas – impõe ao contribuinte em razão da violação de seu direito subjetivo de crédito, positivando o fato ilícito da relação tributária.
Por tais razões, é comum depararmos com situações que nos sujeitam discutir a aplicabilidade de multas majoradas que, em muitos dos casos, ultrapassam o valor da obrigação principal. Para tanto, faz-se necessário observar os Limites do Poder de Tributar inseridos na Constituição Federal do Brasil, que destaca, dentre outros princípios, o Princípio do Não Confisco – que, inserido no inciso IV, do art. 150 da CRFB, veda qualquer pretensão governamental que possa conduzir, no campo da fiscalidade, à injusta apropriação estatal, no todo ou em parte, do patrimônio ou rendimentos dos contribuintes, de maneira a lhes comprometer em razão da insuportabilidade da carga tributária –, bem como os Princípios da legalidade, razoabilidade, proporcionalidade, motivação, ampla defesa e do contraditório.
Todavia, mesmo com a preocupação do constituinte de inserir princípios à Carta Magna, inexiste, em nossa legislação, qualquer indicação quanto aos parâmetros para configuração de multa com efeito confiscatório. Assim, em razão de tal lacuna, os Entes Federativos (União Federal, Estados-Membros, Municípios e Distrito Federal) legislam sobre as multas tributárias aplicando alíquotas que, muitas das vezes, ultrapassam os limites da regra do Não Confisco, eis que fica a cargo do Poder Judiciário utilizar-se do seu livre conhecimento para os fins de definir se determinado valor cobrado pela administração pública está apropriado, adequado, razoável, ou se o mesmo é inconstitucional e tem efeito de confisco.
Destaca-se, portanto, que em razão da necessidade de haver um critério limitativo para aplicação das multas tributárias – de maneira que seja afastada qualquer incerteza do contribuinte e, principalmente, que sejam respeitadas as atribuições meramente punitivas e desestimuladoras –, o tema vem sendo amplamente discutido no judiciário, alcançando repercussão geral com recurso pendente de julgamento pelo Supremo Tribunal Federal, como se observa no RE 736090/SC, o qual discute os limites da multa fiscal qualificada em razão de sonegação, fraude ou conluio, tendo em vista a vedação constitucional ao efeito confiscatório.
É preciso estar atento, pois o próprio STF já se posicionou em limitar o valor das multas em percentual não excedente a 100% sobre o valor do tributo, como ocorreu no julgamento do RE 83.106/GO, devendo tal posicionamento ser adotado pelos tribunais. Portanto, na ocorrência de aplicação de multa que exceda os limites entendidos como proporcionais e de flagrante violação à razoabilidade, é cabível levar à discussão ao judiciário para resguardar os direitos do Contribuinte.
*Ana Paula Rosa é Coordenadora do Conselho Jurídico da ASSERJ.
*Coluna publicada na revista SUPER NEGÓCIOS.